Comunidade do Bom Despacho protesta por causa de água em Passo de Camaragibe
Ao longo de 143 anos, desde a fundação do Passo de Camaragibe, município localizado na região Norte de Alagoas, a comunidade do Bom Despacho, certificada como remanescente de quilombo pela Fundação Cultural Palmares em 2009, nunca teve água potável em suas casas. A água para uso geral sempre veio de 4 quatro poços localizados a mais de 2 quilômetros do povoado, água não tratada que atualmente é levada até uma caixa no alto da comunidade e distribuída para as residências em precárias tubulações instaladas a mais de 20 anos. Cada casa tem sua própria bomba para levar a água para dentro das residências. Já para ter acesso a água para beber, os moradores precisam caminhar a mesma distância até uma cacimba, ao lado da estrada parque da Rota Ecológica e levá-la até suas casas em latas de carro, de moto, cavalo, bicicleta e na maioria das vezes a pé.
Agora, os mais de 2 mil moradores do povoado de Bom Despacho, 50 por cento remanescentes de quilombolas, estão em pé de guerra e protestam, sobretudo, contra a prefeitura do Passo de Camaragibe, que recebeu, segundo eles, mais de 14 milhões de reais da empresa Verde Alagoas, vencedora do leilão realizado na Bolsa de Valores B3, em São Paulo, para prestar, durante 35 anos, os serviços de água e esgoto nos municípios do Bloco C, formado por cidades do Litoral Norte e Zona da Mata, incluindo o Passo de Camaragibe.
Lideranças comunitárias como José Sebastião dos Santos, quilombola nascido no povoado, Josineide dos Santos e Jonatas Daniel, acusam a prefeitura municipal de, primeiro ter aderido ao Marco Legal do Saneamento, que permitiu em seguida a realização do leilão do Bloco C, sem nenhum tipo de reunião e consentimento com a comunidade e assim ter transformado a empresa Verde Alagoas, dona dos poços e cacimbas existentes na região, que nunca teve água encanada. E o pior, segundo os moradores, é que a prefeitura teve os valores depositados em sua conta e nenhuma benfeitoria foi realizada na comunidade. Outro povoado quilombola afetado pela decisão foi o da Perpétua, que também terá seus poços privatizados pela empresa.
Foi a partir de 1º de outubro de 2022, que os serviços de água e esgoto de 27 municípios alagoanos da Zona da Mata e Litoral Norte serão fornecidos pela Verde Alagoas. Na última terça-feira, dia 17, representantes da empresa estiveram no povoado de Bom Despacho. Segundo Jonatas Daniel, que esteve na reunião, os representantes comunicaram aos moradores que iriam iniciar o cadastro de todos os consumidores, colocação de hidrômetros nas casas e cobrança de taxa de consumo de água. Segundo ele, não disseram, no entanto, nada em relação às benfeitorias exigidas pela população, como água potável dentro das casas. Os moradores afirmam que não vão pagar um centavo sequer antes que as melhorias sejam realizadas para todos os mais de 2 mil habitantes. E caso a situação permaneça, vão, inclusive, protestar, fechando a rodovia.
Reconhecida como uma das maiores concessões de serviço público do país no ano de 2021, a operação dos blocos B e C teve parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e deverá injetar recursos no valor total de R$ 1,7 bilhão, diretamente nos cofres das prefeituras participantes ao longo de 2022, e R$ 2,9 bilhões ao longo dos próximos anos. Em março de 22, os 61 municípios alagoanos receberam do Governo do Estado R$ 1,050 bilhão, entre outorga e indenização, para realização do saneamento nas regiões do Sertão e Agreste (Bloco B), pela empresa Águas do Sertão; e do Litoral e Zona da Mata (Bloco C), pela empresa Verde Alagoas.
O passo, após a assinatura do contrato, e que as empresas vão assumir os sistemas, se organizar e começar os investimentos para levar água onde não tem, para coletar e tratar o esgoto e, assim, não descartá-lo in natura nos córregos, nos mananciais”, explicou o governador Renan Filho na época.
NOTAS
Em Nota a Verde Alagoas afirmou que assumiu a operação dos serviços de abastecimento de água e esgoto, em outubro de 2022, em 27 municípios do Litoral Norte e Zona da Mata. A concessão é de 35 anos e neste período a empresa visa investir R $1 bilhão na infraestrutura de saneamento. Gradativamente, a empresa vai realizar melhorias na ampliação e na modernização de todos os sistemas, que beneficiarão mais de 400 mil alagoanos. O povoado de Bom Despacho, em Passo do Camaragibe, faz parte do escopo da empresa que tão logo atuará em melhorias na localidade. Desta forma, a Verde pede licença aos moradores para operar e realizar melhorias no abastecimento. A cobrança dos serviços é realizada após realização do cadastro e total distribuição da água no local.
Por sua vez, também em Nota a Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) informou que não atende diretamente os moradores de Passo de Camaragibe, os quais são clientes, desde outubro de 2022, da concessionária Verde Alagoas. Assim, a Casal não implanta hidrômetros e nem faz cobranças aos moradores, os quais não são mais clientes da Companhia. A função da Casal no município é produzir água (captar e tratar) para repassar à Verde Alagoas, a qual faz a distribuição aos moradores. A Companhia também ressalta que opera poços apenas nas localidades Marceneiro e Barra do Camaragibe. A água desses poços é repassada pela Casal para a concessionária Verde distribuir aos moradores e fazer o faturamento.
Por Claudio Bulgarelli – Sucursal Região Norte com Tribuna Independente