Lei aprovada na Câmara é considerada inconstitucional

Vereador Leonardo Dias conseguiu a aprovação do projeto de lei na Câmara de Vereadores, no entanto para ter validade, a lei precisa ser sancionada pelo prefeito de Maceió, JHC - Foto: Assessoria
É inconstitucional o projeto de lei do vereador Leonardo Dias (PL), que prevê a obrigação de todos os estabelecimentos da rede municipal de saúde a orientarem pacientes sobre “riscos e consequências” do aborto legal. A lei foi aprovada na última quinta-feira (9), na Câmara de Vereadores, com apenas uma abstenção da vereadora Teca Nelma (PSD).
À reportagem da Tribuna, a advogada Andrea Alfama, explicou que o projeto de lei aprovado traz a revitimização de mulheres que já se encontram em situação de vulnerabilidade do ponto de vista físico e emocional.
“Por que que esse projeto é ruim? Ele é uma forma de intimidar uma mulher que já está em uma situação de vulnerabilidade. Para recorrer ao aborto legal, existem três situações, que é a gravidez decorrente de estupro, risco de morte para a mãe ou a inviabilidade de vida extrauterina, quando os fetos são encéfalos e comprovadamente não há possibilidade de vida após o nascimento. São situações que a lei protege”, explica a advogada.
Andrea lembra ainda a Lei do Minuto Seguinte (12.845/2013), que garante tratamento imediato e humanizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para mulheres vítimas de violência sexual.
“Esse projeto significa a institucionalização da prática de tortura e de revitimização de mulheres que já se encontram em situação de vulnerabilidade do ponto de vista físico e emocional por ter que recorrer ao aborto legal, que diga-se de passagem, é procedimento assegurado no ordenamento jurídico brasileiro, nas situações previstas em lei. Essa lei é uma forma de pressionar as mulheres que tem direito de recorrer ao aborto legal para que desistam. Qual o intuito de esmiuçar detalhes de procedimento cirúrgico senão praticar violência psicológica e impor medo para que a mulher desista?”, questiona a advogada.
SEM COMPETÊNCIA
Para Andrea, a Câmara de Vereadores de Maceió não dispõe de competência para legislar sobre essa matéria.
“Além do mais, a institucionalização de tal prática afronta diretamente a dignidade da pessoa humana. O estado não pode permitir que práticas atentatórias à dignidade humana sejam institucionalizadas. É um contrassenso. É um projeto bizarro, aprovado unicamente com o objetivo de impor mais uma forma grave de violência contra as mulheres. Tanto é, que da forma que esta lei foi aprovada, ela acaba se configurando como uma afronta direta à Lei do Minuto Seguinte [aprovada no Congresso em 2013 e ainda em vigor]. No final das contas essa excrescência legislativa aprovada impõe um incentivo à criminalização da mulher grávida que busca ajuda, o que pode causar danos irreversíveis a sua saúde, além do desrespeito à sua dignidade no tratamento que é assegurado por lei federal”, continua.
A advogada lembra que o projeto de lei não estava na ordem do dia da Câmara de Vereadores e que houve uma manobra dos vereadores Leonardo Dias e Gaby Ronalsa (PV) que “enxertaram” o projeto para votação.
“A vereadora Teca Nelma [PSD] está desde o ano passado tentando barrar esse projeto e já existia um parecer falando da inconstitucionalidade dessa lei. Mas, para que fosse a plenário, Leonardo Dias e Gaby Ronalsa, que fazem parte do Movimento Pró-Vida, realizaram uma manobra golpista e enxertaram esse projeto na ordem do dia. A Teca inclusive se retirou do plenário e se recusou a participar dessa patifaria. E então o PL foi aprovado por unanimidade e agora estamos aguardando se vai para sansão”, contou Andrea.
Por fim, Andrea Alfama diz que apenas uma palavra define o projeto de Leonardo Dias: retrocesso. “É um projeto que afronta diretamente a dignidade da mulher, ajuda a perpetuar práticas violentas, misóginas e que contrariam a dignidade humana. Tenho certeza que o movimento feminista em Alagoas e as organizações que atuam pelos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres irão até as últimas consequências do ponto de vista legal para barrar essa atrocidade”, concluiu.
INCONSTITUCIONALIDADE
Em contato com a reportagem da Tribuna, a vereadora Teca Nelma disse que, enquanto parlamentar, não vota em projetos que não estão dentro da constitucionalidade, o que foi o caso deste apresentado por Leonardo Dias.
“Eu só posso mexer no SUS em âmbito nacional. Por esse motivo, decidi não participar da votação, pois o referido projeto não estava de acordo com as regras da Casa Legislativa, o que sou totalmente contra. No dia 13 de dezembro, pedi vistas dessa matéria e pedi um parecer da Procuradoria da Casa. Dia 16 saiu o relatório que o projeto era inconstitucional. O PL foi incluído de surpresa em pauta, foi um processo atropelado por questões políticas e formado por uma bancada conservadora. A matéria nem deveria ter entrado em pauta”, conta a vereadora.
“Reitero que sou contra trâmites que não respeitam as regras da Casa Legislativa e o parecer que atesta sobre a constitucionalidade. Por isso decidi não participar da votação e sai da sessão. Caso a lei seja promulgada iremos questionar sua constitucionalidade no Ministério Público”, afirmou.
SANÇÃO OU VETO
Para que a lei passe a vigorar em Maceió, o projeto do vereador precisa ser sancionado pelo prefeito JHC (PL). O gestor também pode vetar a lei e o projeto retorna para deliberação dos vereadores, que podem manter ou derrubar o veto.
Até o fechamento desta edição, o prefeito JHC ainda não havia se manifestado se vetaria ou se sanciona o projeto de autoria do vereador Leonardo Dias.
Por Thayanne Magalhães com Tribuna Independente