Proteção e enfrentamento marcam atuação da PM no combate ao crime de estupro em Alagoas
Fernanda Alves / Ascom PM-AL
Ao iniciar mais um dia de serviço, uma guarnição policial nunca sabe quais situações vai enfrentar. Há jornadas em que a tranquilidade predomina, outras têm mais adrenalina e tensão, e algumas deixam marcas para sempre. Na tarde de 1º de maio deste ano, a sargento Maria Aparecida viveu um desses momentos que considera dos mais impactantes em seus mais de 22 anos de serviço.
Ela se apresentou para cumprir a escala de 24 horas no 10º Batalhão de Polícia Militar (BPM), com sede em Palmeira dos Índios, que também é responsável pelo município de Maribondo, onde funciona um Centro Integrado de Segurança Pública (Cisp). Durante patrulhamento pela cidade com sua guarnição, a comandante foi informada pela Central sobre um possível caso de estupro, envolvendo uma criança de sete anos como vítima e um autor de 63 anos.
Ocorrências em números
O episódio de Maribondo é o único com registro formal pela Polícia Militar de Alagoas (PM-AL) na cidade em 2024, mas faz parte dos 19 contabilizados na área de abrangência do Comando de Policiamento da Região Agreste (CPRA) neste ano. Embora esses números chamem atenção, representam uma queda em relação aos anos anteriores, quando 30 casos foram registrados tanto em 2022 quanto em 2023.
Em nove meses deste ano, a PM-AL registrou, em todo o estado, 73 casos de estupro, sendo 12 deles ocorridos apenas no mês de setembro, período com maior incidência até agora. Os dados são da 2ª Seção do Estado-Maior Geral (EMG) de Estatística e Ciência Aplicada da Corporação e foram extraídos das informações da Central de Atendimento e Despacho (CAD) da Secretaria de Segurança Pública (SSP).
No recorte de atendimentos realizados pela PM-AL, somando estupro e estupro de vulnerável, foram 111 ocorrências em 2022 e outras 107 em 2023. A área de abrangência do Comando de Policiamento da Região Metropolitana (CPRM) lidera o número de registro de casos, sendo 49 em 2022, 44 em 2023 e 23 registros até setembro de 2024.
Em segundo lugar nos grandes comandos, aparece o território do Comando do Agreste, conforme apresentado anteriormente, com 30 registros em ambos os anos e com 19 em 2024. O Sertão (CPRS) apresenta o menor quantitativo de casos contabilizados pela PM: três em 2022, nove em 2023 e a mesma quantidade até setembro de 2024.
Ao observar o relatório da 2ª Seção, nota-se também que Maceió aparece na primeira colocação entre os municípios do CPRM e também alagoanos: 33 estupros atendidos pela PM em 2022, um caso a mais em 2023 e 20 ocorrências até setembro deste ano. O bairro do Benedito Bentes reúne o maior quantitativo, 16 casos distribuídos entre os três anos, sendo: seis em 2022, subindo para 7 em 2023, e três no ano de 2024.
O perfil de vitimização aponta que indivíduos do sexo feminino sofrem mais esse tipo de violência: 100 (em 2022), 95 (em 2023) e 58 (em 2024). Entre os indivíduos do sexo masculino foram 11 (em 2022), 12 (em 2023), mas cresceu em 2024, tendo 15 registros até setembro. A faixa etária aparece como outro dado alarmante: as vítimas em maior quantidade são aquelas com idades entre 10 e 14 anos. Foram 72 casos registrados. Em 2022, com 13 registros, subindo para 25 em 2023; e 23, em 2024.
Já o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024 aponta que, em números absolutos, em 2022 foram 19.073 casos de estupro no Brasil. Destes, 244 ocorreram em território alagoano. Foram 20.124 registros de estupro em 2023 no país, com 878 em Alagoas. Quando o assunto é estupro de vulnerável, são 59.761 casos em âmbito nacional e 827 em Alagoas no ano de 2022. Os números subiram para 64.237 no ano seguinte em todo o País, com 878 registros em Alagoas. Em resumo, somando os casos, foram 1.071 incidentes em 2022 e 1.119 em 2024, só em solo alagoano. Os números são da Segurança Pública como um todo.
O ato criminoso
O Código Penal brasileiro, em seu Artigo 213, define estupro como o ato de constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou praticar, ou permitir que com ele se pratique, outro ato libidinoso. A pena prevista é de reclusão de seis a 10 anos.
O código também tipifica o crime de estupro de vulnerável como ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com quem não tem o discernimento necessário para o ato, ou com quem, por qualquer motivo, não pode oferecer resistência. O caso atendido pela sargento se enquadra nessa tipificação. A legislação também prevê que, em casos de estupro de vulnerável, a pena pode ser aumentada para reclusão de oito a 15 anos. Se a conduta resultar em morte, a pena varia de 12 a 30 anos.
Naquele Dia do Trabalhador, em Maribondo, enquanto muitos aproveitavam o descanso, a mãe não sossegou até que as autoridades competentes soubessem do crime. A Polícia Militar também não descansou até localizar o suspeito. Determinada, ela ligou para o 190 e, ao mesmo tempo, dirigiu-se ao Cisp. No Centro Integrado, mãe e filha foram recebidas por um policial civil, e este prontamente acionou a guarnição da PM-AL. Supondo se tratar do mesmo caso informado anteriormente pela Central, a equipe foi até o Cisp rapidamente.
No dia anterior, a criança teria ido à casa do vizinho como de costume. Dessa vez, porém, ao retornar para a sua casa, a menor revelou à sua mãe que não voltaria mais lá. O vizinho teria beijado sua boca e tocado as partes íntimas. A mãe da vítima procurou imediatamente ajuda institucional. Com suporte do Conselho Tutelar do município de Maribondo, a mãe, acompanhando a menor, confeccionou o Boletim de Ocorrência na Central de Flagrantes, em Maceió. A vítima foi levada ao Hospital da Mulher onde recebeu atendimento especializado e realizou exames. No dia seguinte, a mãe da vítima viu o vizinho em casa “como se nada tivesse acontecido”. A mulher ligou para o 190 e foi até o Cisp.
“Fomos imediatamente até o endereço informado pela mãe da criança, na residência onde acontecera o possível crime, residência do acusado. No local, encontramos o homem, de 63 anos. Ele disse não saber o porquê de a polícia estar na sua porta. Ele foi informado do motivo pelo qual estava sendo conduzido até a delegacia, mas negava o fato, dizendo apenas que a criança esteve em sua casa, afirmando que somente lhe deu um beijo na cabeça e um abraço, pois são vizinhos e a criança, assim como toda a família, já tinha o costume de frequentar sua casa. Nós da PM-AL conduzimos todos os envolvidos até o Cisp de Viçosa, onde funcionava a delegacia plantonista daquele dia, para a adoção das providências cabíveis”, narrou a comandante da guarnição.
A presença da mulher, na denúncia e no combate
A insistência da mãe da vítima chamou a atenção da equipe, já que, muitos pais, responsáveis ou vítimas se omitem por temor, vergonha ou mesmo falta de informação. “A coragem e a insistência da mãe em procurar a polícia e as outras instituições, até que fossem tomadas as devidas providências, foi o que mais nos impactou. O crime de estupro de vulnerável tornou-se uma triste realidade. As pessoas desconhecem a tipificação penal, e que a prática do crime independe da conjunção carnal. É extremamente necessário que haja ampla divulgação no que diz respeito à violência sexual. Há uma necessidade de que todos saibam que não há mais o que se discutir sobre o estupro de vulnerável. É crime!”, salientou a sargento Aparecida.
A comandante de guarnição também destacou a atuação policial em sentidos diversos: “Digo isso, não apenas porque sou mulher, mas a presença de uma policial feminina principalmente em relação a esse tipo de ocorrência que envolve menores é importante. Pois, a figura feminina aproxima a vítima da autoridade policial, trazendo a sensação de segurança e liberdade para se comunicar sobre um assunto tão delicado, e isso é muito importante. O papel da PM, de maneira geral, é imprescindível nesses casos. Outro ponto importante que é válido salientar, é a integração das forças de segurança nos Cisps. No caso específico, o relacionamento entre as equipes das duas polícias facilitou e agilizou a prisão do acusado”.
Esse caso foi o primeiro dessa natureza que a militar atendeu, mas ela já se deparou com outras situações tão delicadas quanto preocupantes. “Geralmente os casos de estupro de vulnerável denunciados envolvem conjunção carnal, lesão corporal grave e homicídio. Já acompanhei o IML em uma operação de achado de dois cadáveres. As vítimas eram irmãos, ambos menores que, antes de serem mortos, sofreram estupros, conforme lesões encontradas nos corpos e descritas pelos peritos no local dos crimes”, recordou-se.
Denúncia
Pedir ajuda e denunciar são formas eficazes de combater a violência. Um dos canais disponíveis é o serviço Disque-Denúncia, pelo número 181, que é anônimo e gratuito. Para ocorrências em flagrante, o 190 está disponível 24 horas por dia. Além disso, ao procurar uma delegacia da Polícia Civil, é possível formalizar um Boletim de Ocorrência.
“Voltando ao caso específico, a criança foi vítima de estupro, e a mãe não foi omissa em momento algum, inclusive em relação à maneira como o crime foi cometido. Embora a criança possa não ter discernimento sobre a gravidade do ocorrido, ela ficou tão incomodada que relatou à mãe. Quantas vezes, ou quantas pessoas foram vítimas desse agressor? Quantas crianças foram ou são estupradas e só entenderam, ou entenderão no futuro, na fase adulta? Por falta de conhecimento, de coragem, ou porque um adulto foi omisso”, disse a militar provocando uma pertinente e urgente reflexão.