MULHERES NEGRAS
Escuto estrelas. Elas são muitas. Possuem diferentes grandezas. Seus brilhos são do tamanho do alcance de suas mensagens que, invariavelmente, são significativas para o processo civilizatório ao qual conscientemente me submeto em busca do meu melhor ser.
Escuto estrelas Negras que um dia foram silenciadas pela violência de suas rotinas, como ensinou-me Conceição Evaristo: a voz da minha avó ecoou obediência. A voz da minha mãe ecoou baixinho revolta. A minha voz ecoa versos perplexos. A voz da minha filha recolhe todas as nossas vozes… Na voz da minha filha se fará ouvir a ressonância do eco da vida-liberdade.
Escuto estrelas Negras para ser livre. Elas brilham na constelação das 100 mulheres mais inspiradoras e influentes do ano de 2023, elaborada pela BBC. Com elas desejo aprender a quebrar as correntes que me prendem a brutalidade. São as vozes de Shamsa Araweelo, da Somália; de Neema Namadamu, da República Democrática do Congo; de Ulanda Mtamba, do Malawi; de Bella Galhos, do Timor Leste; de Paulina Chiziane, de Moçambique; de Renita Holmes, dos EUA que me alimentam com as suas potências: somos resiliência, fortes, feitas para nutrir.
Nutrida, escuto estrelas Negras para conhecer de mim. Com Carolina de Jesus, um eu tão diferente do meu, desnudo-me das ignorâncias para entender o que nos une: não digam que fui rebotalho, que vivi à margem da vida… Digam ao povo brasileiro que meu sonho era ser escritora, mas eu não tinha dinheiro para pagar uma editora.
Com o Quarto de despejo em mente, obra de Carolina de Jesus, escuto a animados ritmos de jovens estrelas Negras para cevar o meu existir. Meu corpo duro, sem molejo, sofre na tentativa de acompanhá-las. A rigidez dos membros destoa da elasticidade do cérebro, sedento para aprender as lições que delas veem. Ouço Mel Duarte dizer: mantenha a sua fé onde lhe couber… É teu desejo de mudança, a magia que trás na tua dança que vai lhe manter de pé.
Sem saber dançar, mas tentando me manter em pé, escuto estrelas Negras porque hora elas me ensinam a resistir, minutos depois a ser livre, instantes após a confiar no que sou. Ouvi-las livra-me dos elos que me prendem ao que não sou. Ensina-me a sair de pessoas e lugares deixando a marca da liberdade do meu ser. É essa a lição que aprendo quando Ryane Leão diz – sobre lugares e pessoas: se não puder ser você mesma, vá embora.
Agora você percebe porque não me curvo, não grito, não me exalto, nem sou de falar alto? Antes que responda preciso dizer-lhe que estas palavras não são minhas, mas gosto de pensar que me comporto como Maya Angelou. Acredite! O brilho desta enorme estrela Negra pode iluminar o seu levantar. Escute-a dizer: deixando para trás as noites de terror e atrocidade, eu me levanto. Em direção a um novo dia de intensa claridade, eu me levanto. Trazendo comigo o dom dos meus antepassados, eu carrego o sonho e a esperança do homem escravizado. E assim eu me levanto. Eu me levanto.
Mentalizando o ‘eu me levanto, eu me levanto’ peço perdão a todas estrelas Negras que sem oportunidades deixaram de brilhar e aqui não foram citadas. Findo com o conselho do poeta baiano Castro Alves, aquele do Navio Negreiro, um astro também luminoso, mas de outro gênero. No poema Ora direis ouvir estrelas, Alves diz que só quem ama pode ter ouvido capaz de ouvi-las e entendê-las. E eu lhe digo que o amor é o sentimento que mais lhe aproxima do seu melhor Ser e é essa proximidade que nos fará reconhecer o brilho que vem de você. Aprenda com elas! Ouça estrelas Negras!!!
Por Lúcia Barbosa