“Braskem já sabia do afundamento de solo antes mesmo do tremor em 2018”
A Comissão Externa da Câmara dos Deputados, que acompanha o colapso do solo em pelo menos cinco bairros de Maceió, realizou ontem (25/9) um Seminário Regional com o Tema: “Acompanhamento dos danos sociais, ambientais e econômicos causados pelo afundamento do solo na capital alagoana”.
O evento, que reuniu ex-moradores e entidades que defendem as vítimas da Braskem, lotou o auditório do Conselho Regional de Medicina de Alagoas (Cremal), no bairro do Pinheiro.
De acordo deputado federal Alfredo Gaspar, o evento foi um sucesso e serviu para dar voz aos prejudicados pela mineração, bem como aos órgãos ambientais e de fiscalização e controle, a exemplo do Instituto do Meio Ambiente (IMA), Ministério Público Federal e Ministério Público Estadual.
Na parte da manhã, quando as vítimas tiveram direito à voz, o deputado Alfredo Gaspar, que coordena o colegiado, disse que “surgiram revelações surpreendentes”. Dentre elas, que “a Braskem tinha conhecimento da subsidência do solo antes do desastre vir à tona, em março de 2018”.
“Outra denúncia que surgiu durante o Seminário, a Braskem estava renovando as licenças de exploração das minas de sal-gema sem apresentar os estudos de impacto ambienta”, acrescentou o deputado.
Segundo ele, tudo leva a crê que “havia uma fiscalização de araque nos poços de mineração”. Tudo isso, garantiu Gaspar, todas essas denúncias serão checadas e incluídas no relatório final.
Na parte da tarde, o deputado e os demais integrantes da Comissão ouviram as autoridades, para saber delas quais as medidas reparadoras tomadas quanto aos danos ambientais causados e os prejuízos causados aos moradores das áreas afetadas.
“Vamos ouvir todos os lados da questão, para poder fazer um relatório o mais fiel possível, independentemente das questões políticas e dos holofotes da mídia”, acrescentou Gaspar.
Questionado se o relatório da Câmara poderia servir de base à CPI da Braskem que está para ser aberta no Senado, o deputado afirmou que sim e que o trabalho dele e dos demais integrante do colegiado não tem partidarismo e nem ideologia.
“Estamos trabalho em defesa das vítimas e do meio ambiente, por indenizações justas e medidas reparadoras. Portanto, quem estiver desse lado e contra a Braskem, tem o nosso apoio”, finalizou.
PRESENTES
Além de Gaspar e do deputado federal Fábio Costa (PP), que são membros Comissão, outras autoridades compareceram ao evento, que reuniu cerca de 300 pessoas, a maioria vítimas do desastre ambiental.
Pelo menos duas entidades não participaram do evento, por não ter sido convidada ou por discordar do formato do Seminário: o Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB) e a Associação dos Empreendedores dos bairros atingidos pelo desastre ambiental.Eles não concordaram com o formado do evento, que ouviu primeiro as vítimas e as autoridades depois.
Comissão ouviu relatos dramáticos das vítimas da mineração em Maceió
Durante o evento, os deputados falaram sobre o andamento dos trabalhos da Comissão, ouviram as vítimas e órgãos envolvidos na apuração do afundamento dos bairros de Maceió. “Os relatos expostos durante o seminário serão utilizados na confecção do relatório, apresentado no final dos trabalhos da Comissão”, afirmou Alfredo Gaspar.
Além dos dois deputados federais de Alagoas, participaram do evento o ex-prefeito de Maceió e atual secretário estadual de infraestrutura, Rui Palmeira; os vereadores de Maceió Leonardo Dias, Rodolfo Barros e Oliveira Lima; o deputado estadual Leonam Pinheiro; representando o prefeito de Maceió, o secretário do Gabinete Civil de Maceió, Felipe Lins; Mourinha, coordenador executivo institucional do gabinete do prefeito JHC; Eduardo Marinho, secretário de Convívio Social de Maceió; e o presidente do Cremal, Fernando Pedrosa.
Pela manhã, foram ouvidos: Marcelo Alves, presidente do Instituto Associativo dos Pais e Amigos do Farol (IAPAF); Yves Maia, advogado do Cremal; Da Paz, presidente da Comissão Maceió Comunidades Afetadas; Maria Rejane Santana, presidente da Comissão SOS pelos Nossos Direitos; Ednete Alves, Comissão SOS Pelos Nossos Direitos; Adilson Araújo, advogado de moradores das regiões afetadas; Fernando Lima, presidente da Associação de Moradores do Bom Parto; Augusto Cícero da Silva, presidente da Associação Comunitária dos Moradores de Bebedouro; José Ricardo Batista, presidente da Associação de Moradores da Gruta do Padre e Adjacências; Rogério Rodrigues, representante dos mutuários da Caixa; Rubens Fidelis, morador do Mutange; e Abelardo Pedro Nobre Júnior, coordenador-geral da Secretaria Adjunta Especial de Defesa Civil de Maceió.
SEDE DE JUSTIÇA
Durante todo o evento, as vítimas relataram suas histórias, em busca de Justiça, como foi o caso da dona Sônia Ferreira. “São cinco anos vivendo com medo. Cinco anos que minha vida e da minha família mudou. Apesar de morar no Bom Parto, de estar com a casa toda rachada, por causa de apenas três casas ficamos fora da área de risco. Mas minha casa está caindo e nada é efeito. Vivo de remédio controlado, e com receio de morrer. É preciso que olhem pela gente”.
Outro depoimento emocionante foi da presidente da Comissão SOS pelos Nossos Direitos, Ednete Alves. “Estamos afundando em lágrimas junto com o solo dos bairros de Maceió. Desde que tudo começou não paramos de lutar por nossos direitos e não vamos parar. A nossa população pede socorro, estamos sofrendo há cinco anos e hoje, estamos tendo a chance de ser ouvidos”, afirmou a ex-moradora vítima da Braskem.
Juiz “censura” reportagem e Movimento divulga nota de repúdio
O juiz Henrique Gomes de Barros Teixeira, plantonista do Fórum de Maceió, atendendo ao pedido do empresário Marcelo José Martins Santos Filho, conhecido por Marcelo Cabeção, determinou a retirada do ar e da internet, da reportagem da jornalista Heloisa Vilela, repórter do Instituto Conhecimento Liberta (ICL), sobre o Caso Braskem e um suposto esquema de corrupção, envolvendo o pagamento das indenizações às vítimas da mineração.
A decisão do magistrado foi tomada no sábado e provocou a reação das entidades em defesa das vítimas do desastre. Segue a íntegra da Nota do MUVB:
“O Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), em defesa fervorosa da liberdade de informação e da imprensa, manifesta veementemente seu repúdio à ação de censura que atingiu as reportagens de Heloísa Vilela do ICL Notícias, relacionadas ao crime da Braskem em Maceió, como também a censura a Folha de Alagoas.
É com indignação que denunciamos que um Juiz plantonista de Alagoas, a pedido de um dos denunciados nas reportagens, determinou a remoção das matérias, acompanhada de uma multa diária de mil reais em caso de não cumprimento.
Estamos ao lado da imprensa independente e comprometida com a verdade, condenando qualquer tentativa de silenciar a liberdade de expressão e a busca pela justiça. A sociedade tem o direito de ser informada, e não permitiremos que a censura prevaleça sobre os princípios fundamentais de uma sociedade democrática.
Reforçamos, assim, nosso compromisso inabalável com a defesa da liberdade de imprensa e informação, e permaneceremos vigilantes na luta contra a censura, em prol de uma sociedade justa e transparente”.
BOICOTE
O Movimento confirmou o boicote ao evento da Câmara Federal: “Com muita estranheza o MUVB constatou a sua ausência no Seminário convocado pelo presidente da Comissão Externa da Câmara, logo o movimento, ao lado de outros, que mais tem lutado pela participação das pessoas atingidas e pela centralidade das vítimas na busca de soluções para o maior desastre socioambiental urbano do mundo, causado pela Braskem. A ausência faz sentir que essa Comissão, talvez, não tenha o real interesse de apontar os verdadeiros problemas e nem propor as reais soluções, às vítimas já contempladas no mapa da Defesa Civil”.
Por Ricardo Rodrigues / Colaborador com Tribuna Independente